terça-feira, agosto 05, 2008

Os nossos 10 dias

E como é descrever 10 dias sem supervisão, de pura descontracção, diversão, convívio com o subtil e oportuno humor polaco, grandes refeições, em cidades como Varsóvia, Cracóvia, Bartkova, Zakopane, Nowy Sacz, Krynica? Eu diria, que pretendendo ser totalmente fiel, é complicado...

Comecemos pelo dia da ida, pelas milhentas recomendações paternais que nos parecem escusadas mas que fundo têm a sua utilidade. Após o primeiro check-in separavam-me a mim e ao meu irmão para nos revistarem; tentei a todo o custo explicar que estávamos juntos mas acho que nem me ouviram, reencontramo-nos na zona de embarque e lá estava o meu telemóvel a tocar: "Mónica, é o papá. Não deixes que te façam isso em Frankfurt nem em algum momento da viagem. Insiste, diz que o João é menor, que tens os documentos dele e que não aceitam separar-se. Faz com que isto não volte a acontecer. Pronto. Já encontraram a porta?". Percebi a preocupação do meu pai quando cheguei ao aeroporto de Frankfurt... Tínhamos de ser unha e carne! Dois putos, menores, com uma só autorização escrita para lá estar, com cinco horas de espera para o voo que nos levaria a Varsóvia. À chegada esperava-nos uma pequena refeição antes de ir dormir...

Era o início da melhor viagem que fiz até hoje! Por tudo. Pelo roteiro, pela companhia (Mirek, Beata, Ola, Yash, Adash, Joanna e marido,Kuba, Kamil, Agnesca, Maria e marido, e o meu João), pelo ambiente, pela hospitalidade...

Acordo de manhã, desço do quarto e já um pequeno-almoço bem diferente do que estou habituada estava em cima da mesa a chamar por mim. Saladas (temperadas com maionese e pimenta), salsichas, ovos, bolos, pão, 4 variedades de fiambre, queijo fresco, muito chá compunham a primeira refeição de cada dia (vim eu a descobrir durante a minha estadia)... Passava-se um dia por pela capital. Visitam-se os pontos turíticos, a parte velha da cidade, alguns museus, o parlamento, os melhores parques e jardins, a avenida principal e aprecia-se a vida agitada dum dia normal da semana...


[Zona antiga de Varsóvia. Uma das poucas que não foi destruída pelos bombardeamentos da 2ª guerra mundial]

De volta a casa é-nos dito para fazer uma mala pequenina para 4 dias em Cracóvia. Levar-nos-iam as restantes malas para Bartkova, o destino seguinte a Cracóvia. 3 horas no comboio. Um comboio parecido com o do Harry Potter, onde há cabines bastante confortáveis e harmoniosas que levam 6 pessoas. O S. Pedro não estava do nosso amigo e portanto fomos recebidos com chuva em 3 dos 4 dia passados lá. Após a primeira noite, olhei pela janela de manhã e pensei:"Bem... passeio hoje nem pensar. Que rica tempestade... era só o que faltava!" Percebi uma hora depois que para o povo polaco tudo se resolve com um simples casaco impermeável. Lá estávamos nós, a andar e visitar Cracóvia e os seus encantos como se nada fosse, debaixo de um chuvada ininterrupta desde as 6.30h(a.m., claro!). Era aqui que o amor do Kuba e do Kamil pela sua cidade vinha ao de cima... Cada lenda, cada história, cada curiosidade, de cada igreja, catedral, túmulo, santuário, rua, praça nos era contada com um brilho nos olhos que não deixava esconder aquele orgulho na sua cidade natal. Neste dia comi o melhor (e maior também!)Kebab de sempre! Como seria de esperar, chegávamos encharcados até aos ossos a casa. Três dias em visita cultural e um dia passado no melhor parque aquático em que alguma vez estive na parte da manhã, e em casa a ver filmes caseiros do tempo em que o Kubitus e Kamilco andavam na creche na parte da tarde! No fim de cada dia íamos sair. Um dia ao bilhar, outro à parte judaica da cidade, a pubs de multi coisas para divertir como bowling, snooker, máquinas, pista de dança (foi aqui que fiquei a saber que o povo polaco dança salsa como eu nunca vi! Ou não tivesse sido eu alvo dum escapezinho para a pista!). Em cada saída nocturna eu dava conta do romantismo de Cracóvia à noite: aquelas esplanadas no centro da praça, com cadeiras e mesas de madeira, delimitadas por canteiros de flores e aquela música de rua feita por grupos que pedem apenas uma moeda em troca daquele ambiente lindo que criam...


[Numa das saídas nocturnas em Cracóvia]


[Umas das muitas esplanadas do centro de Cracóvia]

Rumo a Bartkova.

Aqui íamos passar as últimas noites dormidas em território polaco. Foi-nos mostrado o quarto onde íamos ficar e apercebi-me que tinha varanda com vista para o rio, para a outra margem. Um paisagem verdejante com algumas (poucas) casas lá 'pousadas' com o tecto muito inclinado (preparado para o anual inverno rigoroso) chegando em alguns casos ao chão, era o meu cenário matinal nos próximos dias. Estava tudo planeado ao minuto e tínhamos imenso para ver e visitar ainda! Chegámos sexta à noite. Os quatro dias seguintes foram passados um em Nowy Sacz, outro em Bartkova, outro em Krynica e o último nas imponetes e colossais montanhas de Zakopane (que são polacas e eslovacas ao memo tempo. Só para que conste.).
Nowy Sancz é uma vila pequena, pacata, querida. Tem também a gelataria com os melhores gelados tradicionais que alguma vez comi! No domingo fomos à missa... era numa igreja bonita de madeira. Quando chegámos parecia dia de festa ou de algum santo, tal era o número de pessoas dentro e fora da igreja. Senti-me bem. Dezenas (ou centenas?) de pessoas em silêncio a ouvir o orador, a responder rezando quando solicitado, a ajoelharem-se para comungar. Senti que tinham a mesma devoção que eu ao mesmo deus que eu, com a mesma intensidade que eu. Uma comunidade inteira, incluindo crianças, ali, dedicando uma hora da sua semana com todo o prazer. Nesse dia ficámos pela zona e demos um passeio de barco pelo lago... lindo, diga-se!


[O lago em Bartkova onde demos o passeio de barco]

Um geladinho aqui, outro acolá, e chegava mais um dos sempre fantásticos jantares em Bartkova. Primeiro cozinha-se qualquer coisa, e a seguir sentamo-nos todos nuns bancos propositadamente dispostos à volta duma fogueira a grelhar salsichas e afins, cantando, convivendo, falando, trocando culturas. Tudo num jardim repleto de frutos (mirtilos incluídos), plantas coloridas, árvores grandes, e em frente ao rio! Conseguem imaginar? Chega a sobremesa... um bolo feito em camadas sendo por exemplo uma delas feita de frutos apanhados 3 horas antes. Tudo fresco. A gulodice fala mais alto que o cuidado com a linha e pronto, lá se vão três ou quatro fatias!


[Os jantares prolongados pela noite dentro no jardim da casa dos nossos amigos em Bartkova]


[Uma fatia de um dos bolos deste género feitos durante a nossa estadia]

Um dia em Krynica(de manhã) e numa zona de montanha (à tarde), visitando umas termas onde as águas que se dizem medicinais cheiram incrivelmente mal, comendo sopa de ovos e salsicha dentro duma tigela que é feita em pão, e apanhando, muito pacientemente, mirtilos silvestres para levar para casa para mais um bolo dos deuses.


[A sopa servida no pão]

Chegava o último dia em visita. Dia 29 de Julho de 2008, terça-feira. Era em Zakopane. Teríamos de nos levantar à 4.00h para lá chegar cedo, caso contrário haveria muita gente. Chegámos lá às 6.00h. Começámos a escalar às 7.00h e parámos às 18.10h. Não me esquecerei nunca deste dia. 20 kms a escalar montanhas com mais de 2000m de altitude. Subimos e descemos cumes pelo nosso pé. Quando falo em 'escalar', é mesmo isso, porque não havia caminhos, só pedras, calhaus e penhascos. Todo o percurso a ouvir o correr do rio no fundo do vale, a respirar ar puro, completamente envoltos numa imensidão de natureza... Como lá foi dito: "Uma sensação de liberdade, de um mundo aos teus pés!". Chegámos ao fim do dia sujos, de mãos arranhas, suados, doridos e com fome, porque meio pão com fimbre foi o que comi durante o dia. A caminho do carro para voltar a casa e preparar tudo para regressar a Portugal, olhei para trás uma última vez e vi o quão íngremes, imponentes, altas e colossais eram as montanhas. Pensei:"Foi mesmo ali, naqueles cumes, que eu estive??". E tinha sido.


[A imponência de cada vale]


[A caminho da escalada]


[Uma pequena paragem]


[Junto ao marco que separa a Eslováquia da Polónia]


[O descanso merecido depois de chegar a um dos cumes]

No dia seguinte voltávamos. À entada do aeroporto Frederic Chopin, em Varsóvia, dávamos as últimas gargalhadas naquele país antes de irmos. Estava um homem estendido no chão mesmo em frente à porta de abertura automática do aeroporto. Fomos em socorro, e o Mirek perguntou em polaco se estava tudo bem. Percebemos que o senhor não entendeu e inquirimos de novo mas desta vez em inglês. O senhor era britânico.
- "Are you ok?"
- "oh... yes..."
(uns momentos em silêncio... e aprecebemo-nos dum cheiro carcterístico)
- "Sorry... are you drunk?"
- "No."
- "So, what´s going on?"
- "I´m.... Happy!That´s all."

Ia voar para Londres às 17.30h. Já eram 17.03h.

O regresso foi pacífico e bastante agradável. Travámos conhecimento com um alemão e dois portugueses, bem amáveis por sinal. Chegámos com uma hora e meia de atraso porque as condições climatéricas em Frankfurt não eram as melhores e por isso não davam autorização para descolar.

Uma viagem com o meu irmão, de 21 a 30 de Julho de 2008 que não vou esquecer nunca.
Porquê este relato? Porque fica o registo, a recomendação viva dum país que pouca gente conhece ou ouviu falar a não ser do nome.
Aos polacos e à sua gente.

um beijo*
menina do sorriso